segunda-feira, 26 de abril de 2010

Soneto à Caronte

Caronte - arquiteta do desfecho,
Com tua boca faço último flerte;
Barqueira dos naufrágios derradeiros,
Possuir-te é do poeta - a sede.

Mata-a, poeta! - Pois a tua morte
É a solitária certeira sorte;
Sobra-te o errante - mesmo o que sentes.
Da algoz: um bailar de língua e dentes.

Fraca a carne instiga-te - vil Caronte,
E o mar embala - nu o que te calas.
Fúnebre, íntimo - teus olhos fecha.

Efêmero o gozo que te abraças,
Vazias as palavras que saciam:
O suspiro último de um poeta.

quarta-feira, 7 de abril de 2010

Fumo

Dá-me este cigarro - eis o que trago:
Horas findas no peito - eis que enterradas;
E na alma - pelas horas amargada -
Cravadas as feras de ignoto brado.

Quanto de vida há neste vil trago?
Vês? - São minhas quimeras enterradas!
Ébrio Cogito - loucura amargada.
Quanto de eco há neste meu nu brado?

Tal qual sombra fosse em minha'lma gélida,
Acovardo-me em ver esta batalha:
Degladiam Quimeras e Filósofos.

É vil navalha que faço caminho;
Insana é esta razão de poeta.
Gritas - e tudo o que fica é o eco.