quarta-feira, 29 de setembro de 2010

Vela

Vela
essa dor desfalecida.

vela
que vai sendo consumida.

Vê-la
E não acreditar que é já ida.

Ela,
cicatriz que fora nunca ferida.


tão perto repousa a dor partida.


a última nota sustenida.


chama na vela inda

A
chama já está de despedida

nº9

Um poeta sem idéias
é assim:
muito parecido,
quase
homem.

Borda

Esta prosa,
vos garanto,
está agora
mais gostosa,
mais fogosa
e menos calhorda,
porque o poeta
comeu-a
começando pela borda;

Heresia

Visceral impulso de poeta
essa mania feia de enfeiar a poesia.
E quanto mais enfeita
e quanto mais arruma,
mais feia fica a bruma
que se faz feito espuma
na sinapse do pensamento.
E que nem por relez momento
me encante mais que meu sentimento,
o prazer em lambuzar-se de grafite.
Beleza maior só existe
naquilo que não foi falado.
A poesia mais sincera
não pode ser poemada.
O meu poema mais bonito,
eu só fiz foi enfeiá-lo.
Permita-me, óh vicio do grafite,
que eu não cometa tal heresia!
Não se escreve, meus amigos,
não se deve,
escrever para uma poesia.

segunda-feira, 27 de setembro de 2010

Shh!

Shh!
Silêncio...
Escuta calar a cidade.
Este silêncio que soa saudade
e de que não se sabe de quê.
O silêncio do ronco
de motores,
de sonos mal dormidos;
quiçá poder ouvir as flores
germinar nos asfaltos comidos
pelo tempo
que tudo, absolutamente tudo, de-
vora.
Inclusive o Silêncio,
este murmúrio imenso
de velhinhas a cochixar;
quiçá poder escutar
o que só se escuta
nos estetoscópios.

SHH!
Silêncio, já pedi!
Escuta calar a cidade,
este silêncio que soa saudade;
vai saber de quê!
Se aqui (o) nada me falta,
se neste turbilhão,
o silêncio sobressalta;
quiçá escutar a alma,
que rasga o rosto calma
e morre barulhenta na lama.

SHH!
Silêncio!
Escuta cair essa lágrima,
que tem muito a dizer.
Escuta o silêncio barulhento da cidade;
encrustada saudade
no coração,
no concreto dos prédios,
tão sólido,
tão sólido,
que soa

Solidão.

quinta-feira, 23 de setembro de 2010

Pingo

Cruzei mares
de apostasia;
Naveguei por águas
de pouca calmaria;
Arrebentei a onda,
que arrebentando-me-ia
Mergulhei em abismos
de alma e poesia;
Tantas coisas fiz
que pirata outro não faria;
Dei com a cabeça
no razão da piscina vazia.

Lancei-me na imensidão do Pantalassa,
Mar-mor de sal e lástima

Afoguei-me, enfim;
num pingo,
um pingo de lágrima.

Ao Poemar

Na proa deste navio
a ver o horizonte
ainda menos infinito
enquanto o poesio;
ainda menos infinito
enquanto viro-me para dentro
do meu eu vadio.

Na proa deste colossal barquinho,
ainda pequenino para o eu
que transborda nostalgiando.
Só- eu me recordo de um futuro
que coube em mim já passado.

Vejam, pois, o mar:
acaba de ficar ainda mais salgado.

terça-feira, 21 de setembro de 2010

Ser tão poeta

Meu querido sertão (de almas)
De seca (lágrima)
e galhas (de dor) retorcidas
em (sonhos) cerrados.

Aqui vaga,
em ser tão salobro,
o fantasma sem prumo,
pouco probo,
do poeta esquecido.

Em teu passou tímido
é sempre um pé pretérito,
sempre um pé pegada.

Seria errante este andar
já não fosse errante
ser tão poeta.

Arrasta teus pés pela
seca terra,
Descansa teu corpo aos pés
da escleromórfica
árvore,

que em ser tão bailarina
se entorta toda em graça
forjando sombras
num teatro, que o poeta
fascina.

Segue teu caminho seco,
a deixar na poeira tua poesia
e a levar consigo o pó:
este milenar testemunho
da eternidade fadada a ser só.

Ser tão flor

Rego com sal
as fissuras abertas
em Nava-
lha no infértil solo
que expõe a chaga.
E dela a flor
mais bela
a brotar em tão seca
terra,
em ser tão teimosa.
E a alma
temerosa
hesita em colhê-la -
se é narciso, espinho ou rosa.

Espeta-te, poeta,
e chora,
pois da flor já murcha,
só do espinho gozas.
Em ser tão tardia,
cai chuva no sertão.
Em arder a chaga
e malfazer a cicatriz.
Há de fazer brotar na seca próxima
ainda mais bela flor - espinho ou rosa,
é o que se diz.

Tequila

Te quero
Te ganho
Te perco
Te enrolo
Te guardo
Te engano
Te digo a verdade
Te lembro
Te imagino
Te poesio
Te devoro
Te jogo fora
Te deixo ficar

Mas agora que foi-te embora,
Eu
Tequila.

domingo, 19 de setembro de 2010

Passeio pelo cemitério

Rua onze,
lote treze,
túmulo primeiro.
Ao lado da cripta de ardósia.
Levo flores ao amigo de fim derradeiro.
Trilho o caminho do sal
e da murcha flor que esmureceu.
Não há pressa nos meus passos vivos
rumo à lápide do que padeceu.
Por mim, pedras e epitáfios passam:
A vida pareceu se resumir
aos afagos,
esculpidos na mesma nobre rocha de apedrejos.
A vida pareceu se resumir
aos murmúrios,
que ecoam dos véus dos cortejos.
Rua onze,
lote treze,
túmulo primeiro.
Ao lado da cripta de ardósia,
como me explicou o coveiro.
Aqui deixo as flores
na lápide que leio:
'' Cá jaz Pedro
Augusto Ramos,
póstumo tradutor de almas,
ora casou,
ora cansou,
ora amou
a vida.

quinta-feira, 16 de setembro de 2010

Negociação

Ela adentrou a sala.
Ele já estava sentado.
Eles não se falaram.
Ela o encarou profundo.
Ele carregava os olhos fundos.
Eles se analizaram.
Ela parecia ter certeza.
Ele estava um pouco nervoso.
Eles não precisaram de palavras.
Ele colocou a oferta na mesa.
Ela acenou negativa.
Eles não fecharam negócio.
Ela deu-lhes um sorriso e as costas.
Ele retribuiu o vil afago.

Sístole - bip
Diástole - bip
Foi tudo o que se ouviu da oferta
que pulsou ainda em cima da mesa.

quarta-feira, 15 de setembro de 2010

troco

Meu troco
eu troco
a troco
de nada,
meu troco
eu troco
no preço
da bala,
meu troco
se troca
por qualquer
troço que
já esteja
trocado.

terça-feira, 14 de setembro de 2010

No trilho

Trilho
o caminho do
trilho
o caminho do
risco
o caminho
riscado
pelo trem
fora do
trilho
contrariando
a trilha
que canta
ou(trem)

E se a trilha
for risco,
rabisco o
caminho
ar(r)isco de
rio
se a trilha
for uma canção
de tristeza

Sigo
o caminho do
ralo
o eu,
me
parto...

mas volto,
juro.

Saudade

Hoje acordei
com esta dolorida
saudade na cama
me fazendo companhia.
Saudade,
essa moça miudinha
que dá medo de quebrar
na iminência do toque.
Como dói te lembrar,
quando não te vivi.
Como dói saudadear
quando já te perdi.
Tu, que eu, aqui dentro
guardava,
me fez companhia,
quando a cidade
já despertava.
Ah, abrigo meu,
por que você foi
virar saudade?

sexta-feira, 10 de setembro de 2010

nº 7

Este sentimento
que de um lado fere,
do outro afaga,
se é amor,
bem poderia chamá-lo
Nava-
lha,
escondo,
a mim mesmo,
minto,
trancafio
num mortal
segredo,
numa fantasia

Que escapou,
escapou
de uma
poesia.

Tetrâmera

Quer-me mal,
E faz e finge como tal

Quer-me bem
De pétalas vestida - quer-me sem

Quer-me mal,
apaga a chama

Quer-me bem,
e assim me chama,

Mas já despetalada, está a flor
de bens e mals me queres

domingo, 5 de setembro de 2010

Porque

se eu perder a coragem,
se eu perder a hora
e perder a cabeça
e perder a alma
e perder a fé
e perder a calma,
se eu perder o juízo
e perder a novela
e perder a linha
e perder o último capítulo
e perder o fio da meada
e perder o trem
e perder a alvorada

ainda hei de ver o sol
nascer no outro dia.
E outro trem há de passar
mais anoitinha.
E o fio da meada há de ser
novo começo.
E o útimo capítulo
tem reprise amanhã.
E a linha é melhor nem
ser seguida.
E o fim da novela,
é o começo de outra.
E o juízo que depois
ele me encontre.
E a calma que dê
lugar a euforia.
E a fé que
nunca mais me abandone.
E a alma que se perca
no peito de quem amo.
E a cabeça que
fale mais baixo que o coração.
E a hora me espere
mais um pouco.
E a coragem que perdi,
me ache,
E me dê a chance,
de versar a ti.

sexta-feira, 3 de setembro de 2010

São

Sou o que são,
logo,
sou são.
Sou são
(repido baixinho para mim mesmo)
Sou são.
Sou tão,
Sou tão...
louco?
Sou louco,
todos são.
Sou este
louco-são.

Razão

Razão:
irracional
pós-moderna
ação
de
pensar
Razo;