quinta-feira, 29 de julho de 2010

Ser

Tudo me parece tão (bio)lógico,
que em versar hesito.
Somente sou esta química
que ecoa trágica
caótica
-das vísceras-
de meu teimoso ser?
Em ver essência
na crua existência
do globo ocular lacrimoso.
É sal e água,
mas há de ser alma,
no rosto de quem ama.
É só - grafite e grafia,
mas há de ser alma,
nas mãos de quem poesia.

Encontro

Em uma rua qualquer, que por ser aquela
não era qualquer uma, deu-se o fato caso
que por ter acontecido foi acaso,
mas podia nem ter sido, que mesmo assim
aconteceria outro fato, que outro poeta
culparia a sorte formidável de um destino
outrora traçado para os homens, quaisquer
que sejam, mas traçado foi à mim.

O encontro,
-que nem precisava ter acontecido
para que a vida se seguisse -
de um impotente ( pleonástico ) versador,
com a palavra que ele jurou ódio eterno.

Nem mesmo ela seria para sempre, mas vejam,
estava de terno - e não pela solução da rima.
A palavra engomadinha de Aurélio caminhava
inexorável como se fosse ao infinito.

A pobre, não pode, por fim,
negar que dos homens criatura era
e sendo por homens feita,
amava quem a vil negava - fera!

Teu passo primeiro deu volta meia
seguindo o rumo do brocadilho versador.
Ainda que de varonia vestida, não havia,
mais fagueira figura feminina.
A palavra ao poeta fez-se, enfim, despida.

Como negar o amor ao versador,
se indiferença, ele a oferecia.
A criatura se repetia no criador,
que se transformamando-se-ia em criatura.
Na mais bela feitura dos fatos,
acasos por terem sucedido,
em amor outrora não pretendito
de uma palavra, agora poesia
com um versador, agora poeta.

quarta-feira, 28 de julho de 2010

Uma estrela

se apaga
repousando um último
feixe
em meus olhos.
Há muito morreu,
deixando em luz,
a sombra do que foi.
Dando ainda à
nossa existência
forjada
essência
em inspiração.
Acalentava ainda
meu coração
brocadilho de poeta.
Teu feixe último,
qual seta,
fez sangrar tardia canção.
Morta estrela
de luzes tantas,
há de deixar de ser a sombra
que foste,
para ser inapagável luz
de minhas
lembranças.

sábado, 24 de julho de 2010

O barco

Cala-se
em mar
ressaqueado.
Leva preso
à vela
o peito de
um poeta
ao bel prazer do vento-
Que assobia em baila
uma canção
de tristeza.
Percorre as ondas
e morre.
Morre
molhando os pés
de uma criança
na praia.
Na praia,
nas ondas,
na tristeza,
uma criança.

sexta-feira, 23 de julho de 2010

Poesia,

velha amiga,
sente-se aqui.
Faça-me
derradeira companhia.
Nossas linhas
nada mais são
senão
rugas.
nosso tempo
foi passado,
me parece.
Nasceu passado.
Mas fique mais um pouco,
compartilhe
comigo tua agonia.
Meu caminho sigo,
ainda que
tristeza.
Consolando-me
da certeza
da cova.
Um dó
de tu,
de batalhas companheira.
Fadada a versar
as grandiosidades
de um vazio.
Poesiar a
sinapse de
um vadio.
Ver-se enfim
livre...
no universo
de um
sujo
umbigo.
Eu, minha amiga,
não mergulho
nesta
piscina
rasa.

P. Augusto Ramos

quarta-feira, 21 de julho de 2010

O Domador de Quimeras nº2

Lança
tu
à quimera,
Domador.
Estala
teu chicote
Desenbainha
tua espada
rútila.
Estejas
pronto
para batalha
última.
Teu peito é
trunfo
e o assobio
de tua lança
bailante no ar
há de ser canção.
Mas a quimera-
este monstro
sem coração-
luta também
para ser teu algoz.
Doma-A,
ou domar-lhe-á
Ela
Impõe-te vil
limiar
és louco-são
na afiada
lâmina de
tua lança.
Trilha teu caminho
Ao infinito,
Crava a
espada em
teu próprio peito.
Entrega teu coração
à fera.
Há de domá-la
enfim:
a última quimera
agora tem
peito de
poeta.

segunda-feira, 19 de julho de 2010

De (novo) amar

O tempo passou
qual brisa.
Despercebido
Se fez longe
quanto que olhamos
e não vemos mais
o que há tanto
ficou pra trás.
Restou-nos
abstratos
que vamos
juntando,
mais sentindo
do que vendo.
Nada mais somos
que lacunas,
uma memória
que presa ficou
aos ponteiros
que passaram
indiferentes à
nossa vontade.
Será que já
é tarde?
Ou tarde é
só o que
deixamos
de forma
definitiva para
trás?
Não me faça
assim tão
tarde.
Quiçá me
faça noite
que precede
de novo aurora,
no peito
de quem nunca
se deixou de
amar.

P. Augusto Ramos

Capitão

Há neste sorriso,
de dois e não mais
músculos,
pouco, muito pouco
da criança que deixei de ser.
Abandonei meu
navio
de plástico e sonhos.
Lembro-me que
seu capitão
costumava ser
eu.
Navegando por
sonhos hoje findos,
enfrentando quimeras
hoje não tão feras.
Abandonei o navio
quando deveria afundar
com ele.
Capitão de minhas
fantasias.
Calado em mar de águas frias.

sábado, 17 de julho de 2010

Eu Isso

Amo,
confesso.
Mas este sentimento
não é meu.
Habita
sorrateiro
os dicionários
de outrem.
As línguas
bailantes
de alguem.
Mas amo,
confesso.
Só não sei
se posso
assim chamar.
Amor, como foi
primeiro amado.
Amor, como foi
primeiro pecado.
Amo, confesso.
Mas não dou-me
o pretencioso
direito
de dizer que amo.
Talvez eu Isse.
Talvez eu Aquile.
Só não posso-
me perdoem
os amantes-
chamar meu
Chamar essa
bela
coisa
de amor.



P. Augusto Ramos

quarta-feira, 14 de julho de 2010

Soneto

A alma com parca verdade sacia-se
Da forja vil dos homens se lambuza;
Fita o que deveras é qual medusa,
Encara crua verdade e petrifica-se.

Pergunta aos loucos quanto ousa um espírito;
A loucura é dos sábios grande mérito.
Aqui em terra de juízos humanos,
Malograda é a viturde dos insanos.

Almas pouco ousam conhecer a si,
Antes bainhas que quimeras guardam,
À espadas que por verdade sangram.

Cego dos olhos, talvez; D'alma nunca,
A forja faz-se ver na covardia
Do homem que grandiosidades oculta.

domingo, 11 de julho de 2010

Aos loucos

Quiçá fosse eu
desprovido
deste insano
juízo dos homens.
É que sábios
são em viver
esses malogrados,
Esses felizes
desvairados.
Que olhar lançam
ao mundo? -
me pegunto.
-sois todos loucos,
de certo - diriam.
Vá ver que
somos mesmo,
de perto.
Ah! Quiçá
fosse eu
um louco
e visse
tanta mágica
no que me é
banal.
Dá-me, Deus,
a sorte de
um malogrado
da arte
de viver são.
Dá-me, Deus,
A coragem dos loucos,
Pois são sofro,
em ter de mostrar
a tantos doidos,
que pareço
normal.

quinta-feira, 8 de julho de 2010

Jan(elas)

Adormece a casa
fechando-se em janelas.
eu em-mim-mesmado,
aguardo a visita
tardia de uma palavra.
ébrio da fonte
de morfeu,
ainda habito
essas paredes
e elas me habitam.
Em navalha
entre a víscera
e a alma...
Agora,
somente agora
sou poeta.
Visita-me
insana a palavra
implora-me que
seja escrita.
É tarde...
nunca saberás
dessa poesia.
Flagro-me
fechando a última
janela.

segunda-feira, 5 de julho de 2010

Um poeta

Um poeta
dois poetas
três patetas;
Pensa o mundo
o mundo pensa,
pensa mudo,
pensa tudo.
quiçá pensasse
em por-se
em pé!
falta amor,
poesia,
ou
café?

domingo, 4 de julho de 2010

Poeta Ébrio

um poeta ébrio
a dar com sombras.
escondem-lhe o quê?
que mais revelam
senão assobios.
não posso chamar
canção se de longe vem.
ofício da brisa
o som que longe escuto,
a roubar do peito
a luz.
somente sombras
se forjam
onde outrora
repousava meu
caminho;
somente assobio
escuto da canção
que ecoa
onde agora
era o leito
de meu corpo
frio.

sexta-feira, 2 de julho de 2010

Montanha russa

Montanha russa
a barriga gela;
o horizonte parece longe lá do alto
caindo em sensação de morte.
Deixou além do gelo um vazio.
que há de ser
agora?

des-
truí
quase tudo.
e da última
des-
cida
não houve looping;
e vou descendo
decarrilhado
desembestado
absolvido
do
crime de poesiar
de criar,
qual pássaro livre
dentro da uma
gaiola apertada.
como se não houvesse espaço
só gelo
descida
e uma montanha russa
num parque
em
NY,