Cães e lebres; o homem e a liberdade. A mesma relação paradoxal que envolve os cães tentando alcançar, em vão, as lebres de plástico, é a mesma que envolve a eterna busca humana pela liberdade. Em cada vão momento, a sensação de quase alcançar a lebre, ou quase atingir o estado de liberdade, impulsiona cada vez mais a corrida, a luta pelo objetivo - ora tão próximo, ora tão inalcançável. Poder-se-ia dizer que lebres e liberdade são utópicos, não fossem as concretas batalhas em prol desses ideais; mas ser livre significa poder escolher entre correr ou não atrás das lebres?
Liberdade é um conceito relativizado - varia de indivíduo para indivíduo. Talvez ela se explique pelo direito de ir, vir e permanecer ou até pela possibilidade de expressar uma ideia, dependendo de quem a concebe(a liberdade) . Essa relativização ocorre porque constantemente confundimos ser livres com a sensação de liberdade. Enquanto expressar uma opinião ou até mesmo nadar nu em mar aberto nos dá uma sensação de sermos livres, a liberdade é um conceito arquetipado; por mais que nos sentimos desprendidos dos grilhões que nos forjam, há sempre um grilhão que impede a liberdade plena.
Entendo que ser livre é como ser feliz. Não exise felicidade plena, mas isso não é impedimento para se viver momentos felizes; o mesmo vale para a liberdade. A eterna possibilidade, aliada ao desejo, de alcançar a lebre, mantém o cão na corrida; a eterna busca pela libertação - por que não de si mesmo - mantém o homem vivo.
Não vejo, porém, a liberdade como utopia, apesar de inalcançável. É ingenuidade pensar que muros e barras de ferro são instrumentos de privação de liberdade. O homem em sua grandiosidade, enquanto pensamento, transcende as barreiras físicas. Sonhos, utopias e idéias são tão concretas quanto o concreto que impede a carne de ir, vir e permanecer.
Conclui-se que a liberdade talvez seja uma utopia concreta, por mais paradoxal que isso possa parecer. Uma topia que mantemos sempre à vista, como um arquétipo ( modelo a ser seguido), um guia. Não fossem as concretas lebres, não haveria motivo para correr; e a escolha entre correr ou não é uma metáfora entre viver e não viver, ser ou não ser.
Sobre cães, homens, lebres e liberade: não há um único cão que tenha abocanhado a lebre de madeira- ou de plástico, que seja - da mesma maneira que não há um único cão que tenha parado de correr. Para que ser livre, enquanto podemos escolher correr sempre atrás da liberdade...
Nenhum comentário:
Postar um comentário